Aécio teve a chance de inovar mas não inovou. Indicou a esposa do vice-governador para o cargo de Conselheira.

No começo de 2006, o Governador Aécio Neves teve a liberdade de indicar um nome para compor o Conselho do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. Considerando o perfil progressista e de eficácia que tem marcado seu governo, esperava-se que o Governador inovasse e, pela primeira vez na história de Minas, indicasse um conselheiro de perfil técnico e com independência política. Infelizmente, o Governador não aproveitou a oportunidade que o destino lhe proporcionou e indicou a esposa do Vice-Governador para ocupar a vaga. Os artigos a seguir foram publicados na imprensa mineira.




GOVERNADOR DE MINAS PODE MUDAR HISTÓRIA DO TRIBUNAL DE CONTAS


O processo de indicação de Conselheiros para os Tribunais de Contas no Brasil não é justo nem transparente. Como é do conhecimento geral, critérios político-partidários têm norteado a indicação de ministros e conselheiros para os Tribunais de Contas, seja pelo Parlamento, seja pelo Executivo. Governadores indicam aliados políticos para apreciar suas próprias contas, com visível dúvidas sobre o grau de independência dessas avaliações.

Em Minas Gerais, o Governador Aécio Neves terá uma oportunidade singular de inovar. Em junho terá a prerrogativa de indicar um novo Conselheiro. Alguns nomes de supostos "candidatos naturais" ao cargo têm surgido na imprensa local como o do Vice-governador, Sr. Clésio Andrade, o Presidente da Assembléia Legislativa, Sr. Mauri Torres e o Secretario de Estado de Governo, Sr. Danilo de Castro. Infelizmente, tais nomes são apresentados sem se considerar variáveis imprescindíveis como sua trajetória no trato da coisa pública, seu posicionamento perante irregularidades ao longo de sua carreira, sua competência para assumir o cargo e, fundamentalmente, sua proposta ou projeto para o exercício da função, que é vitalícia.

Ao contrário de perpetuar a perversa cultura de indicação orientada pela preservação do espírito de corpo de políticos e partidos, o Governador tem a oportunidade de mudar essa lógica e indicar, pela primeira vez, um integrante que tenha perfil técnico e, de fato, esteja comprometido com o controle das contas públicas. Trata-se do professor universitário e membro do Conselho Regional de Contabilidade, o Sr. Alexandre Bossi. O professor Bossi, doutor em Contabilidade, tem uma trajetória inequívoca de luta pela transparência do Tribunal de Contas de Minas Gerais, tendo se apresentado em processos anteriores de indicação, na luta por um maior controle social das contas públicas.

Obviamente, salta aos olhos, o fato de não ser razoável colocar políticos fiscalizando contas de prefeitos aliados, ou oposicionistas. Como diz o professor e jurista Yves Gandra, "para termos um Tribunal de Contas independente, deve-se eliminar, por inteiro, critérios políticos na escolha daqueles que compõem uma corte deste nível de responsabilidade." Para que o futuro Conselheiro possa exercer corretamente seu papel fiscalizador e julgador, espera-se que atenda aos princípios da imparcialidade e competência técnica, quesitos indispensáveis para a gestão de uma instituição responsável pela avaliação aplicação do dinheiro público. Afinal, no atual contexto de repetidos escândalos de desvio de dinheiro público, é visível que a atuação dos Tribunais de Contas tem sido acanhada, intempestiva e totalmente distante dos olhos da população, que clama por moralidade na gestão dos recursos públicos.

Como mudar esse estado de coisas?

O Governador Aécio Neves pautou sua gestão no Executivo mineiro pelo "choque de gestão". Agora, indicando um novo membro, efetivamente comprometido com uma fiscalização técnica e implacável com a má utilização do dinheiro público, ele pode catalisar processo similar na Corte de Contas de Minas Gerais.
(Paulo Cezar Consentino dos Santos - Presidente do Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais)




OFÍCIO ENVIADO AO GOVERNADOR AÉCIO NEVES - CARTA ABERTA


Ofício nº 024/2006-PRES-CRCMG
A Sua Excelência o Senhor
Aécio Neves da Cunha
Governador do Estado de Minas Gerais
Belo Horizonte - MG

Belo Horizonte, 7 de abril de 2006.

Senhor Governador,

No final do mês de maio Vossa Excelência terá a incumbência de indicar o nome de um novo Conselheiro para o Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais.

Como já é de seu conhecimento, no Brasil, critérios, principalmente políticos, têm norteado a indicação de ministros e conselheiros para os Tribunais de Contas, seja pelo Parlamento, seja pelo Executivo. E com preocupação o Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais tem acompanhado, pela mídia, a movimentação de políticos pleiteando a preferência de Vossa Excelência.

A classe contábil mineira, por meio do CRCMG, defende a indicação de um representante da sociedade civil para o cargo, e não de um político. Na nossa concepção, os Tribunais de Contas devem ser órgãos técnicos, isentos, que, em nome do povo, fiscalizam a sanidade das administrações públicas. A própria justificativa dos Tribunais de Contas reside na confiança depositada em sua independência, integridade e saber. Assim, acreditamos que o próximo Conselheiro deva atender, prioritariamente, aos requisitos de imparcialidade e de capacidade técnica.

Neste sentido, entendemos que o profissional graduado em Ciências Contábeis tem um perfil adequado para o cargo. A própria Constituição mineira, quando estabelece os pré-requisitos para a indicação do Conselheiro, cita a área contábil como uma das preferenciais. Afinal, o objeto da análise do futuro Conselheiro são as contas públicas e, portanto, deve ser conhecedor de temas afetos à contabilidade, como a execução orçamentária, despesas e receitas governamentais, licitações e contratos, e avaliação da gestão patrimonial, financeira e econômica.

Visando subsidiar a escolha de Vossa Excelência, o Plenário do Conselho Regional de Contabilidade de Minas Gerais, apresenta para sua apreciação, o nome do Conselheiro deste Órgão, Alexandre Bossi Queiroz, como um aspirante ao cargo. O Contador Alexandre Bossi é professor universitário, doutor em Contabilidade e Finanças, mestre em Contabilidade Internacional e consultor concursado na Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais.

Esperando que Vossa Excelência inove, mais uma vez, quebrando um paradigma em prol da sociedade mineira na oportunidade que ora se apresenta, colocamo-nos ao seu inteiro dispor.

Respeitosamente,

Contador Paulo Cezar Consentino dos Santos
Presidente do CRC-MG



DEU A LÓGICA


A lógica brasileira para indicação de conselheiros para os Tribunais de Contas é prejudicial aos interesses da nação. Historicamente, critérios político-partidários têm norteado a indicação de conselheiros para os Tribunais de Contas, seja pelo Legislativo, seja pelo Executivo. É comum governadores indicarem aliados políticos para apreciar suas próprias contas.

Em Minas, infelizmente, deu a lógica. No final de outubro o governador Aécio Neves indicou a ex-prefeita de Três Pontas e ex-presidente da Associação Mineira de Municípios, Adriene Andrade, esposa do atual vice-governador, Clésio Andrade, para ocupar o cargo de Conselheira no Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais. A futura Conselheira terá a missão de fiscalizar a aplicação do dinheiro público e de punir, com rigor, gestores e prefeitos corruptos e ineficazes.

Não questionando a capacidade técnica da futura Conselheira para exercer o cargo de juíza de contas públicas, indago: qual será sua imparcialidade para apreciar e julgar as contas do seu marido, o vice-governador Clésio Andrade e do governador Aécio Neves, que a indicou? Qual será o seu grau de independência para julgar contas de prefeitos aliados, ou oposicionistas, quando ocupou a presidência da Associação Mineira de Municípios?

Entendo que reveste da maior importância que o conselheiro do Tribunal de Contas possa ter a imparcialidade e a capacidade técnica necessária para julgar, com isenção e competência, as contas de Prefeitos e Administradores Públicos. A exemplo do que ocorre em outros países, ser imparcial deveria ser uma condição indispensável na indicação para o importante cargo de "juiz de contas públicas".

O governador Aécio Neves, que pautou sua atuação no Executivo pelo chamado choque de gestão, aprovado nas urnas pela grande maioria dos mineiros, poderia ter inovado. Ao invés de manter a viciada cultura de indicação orientada pela preservação do espírito de corpo de partidos e políticos, poderia ter indicado para ocupar o cargo um cidadão com perfil técnico, efetivamente comprometido com uma fiscalização profissional e implacável com a má utilização do dinheiro público. No entanto, não o fez! Acordos políticos e alianças, quiçá em prol de uma governabilidade, mais uma vez, venceram.

Com isso perguntamos: até quando vamos ter que esperar por mudanças? Até quando esperar que o Tribunal de Contas deixe de ser um eterno desconhecido e tenha uma atuação exemplar, punitiva àqueles que desviam o dinheiro público? Até quando seremos míopes em não perceber que casos de corrupção devem ser tratados com a frieza da técnica e não com o calor da política, como se algo pudesse ser negociado? Até quando teremos que esperar amadurecer nossa democracia, de modo a fortalecer nossas instituições?
(Alexandre Bossi Queiroz - Prof. Doutor do Centro Universitário UNA e Consultor concursado na Assembléia Legislativa).

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