Uma história real


O INÍCIO

Em meados de 1999, indignado com as indicações políticas para o cargo de Conselheiro do Tribunal de Contas, decidi apresentar-me como candidato.
Consultando a Constituição Mineira, constatei que atendia a todos os pré-requisitos para o cargo, quais sejam: idade mínima de 35 anos, idoneidade moral, reputação ilibada, formação acadêmica e mais de 10 anos de experiência para a função.
No entanto, as coisas começaram a complicar quando descobri que, para me candidatar precisava do apoio formal de 20% dos deputados estaduais mineiros. Ou seja, não bastavam os requisitos constitucionais. Ao buscar o apoio parlamentar comentando minhas intenções, as reações foram as mais diversas possíveis: alguns rechaçaram de cara a possibilidade de um cidadão comum, não deputado, disputar o cargo; outros viram com simpatia minha disposição em concorrer; outros, ainda, espantaram-se com o inusitado de minha candidatura. Ao final, após muita insistência, e para a surpresa de muitos, consegui que 25% dos deputados assinassem um documento permitindo minha participação na disputa.



A PRIMEIRA TENTATIVA

Após a garantia de minha participação convoquei a imprensa e apresentei-me como um candidato alternativo à vaga do Tribunal de Contas. A aceitação da minha candidatura pela opinião pública foi imediata. Minha formação acadêmica, minha experiência como ex-funcionário do Tribunal de Contas e minha independência político partidária, imprimiam à candidatura a isenção e a capacidade técnica necessária ao cargo de Conselheiro, em contraposição à imagem dos outros cinco candidatos, todos deputados em exercício, que se debatiam para conseguir a almejada vaga. Além disso, apresentei um rol de propostas polêmicas (abaixo). Defendi, por exemplo, uma ampla auditoria nas contas da Assembléia Legislativa, que até hoje nunca foram auditadas pelo Tribunal.
A imprensa teve um papel importante nessa minha primeira candidatura. Era a primeira vez, desde a criação do Tribunal de Contas de Minas Gerais, em 1935, que um cidadão conseguia a proeza de quebrar um paradigma e, lutando contra todo o corporativismo dos deputados, apresentava argumentos sólidos e consistentes a uma candidatura técnica. Noticiaram o acontecimento jornais de âmbito regional (Estado de Minas, Hoje em Dia e O Tempo) e nacional (Gazeta Mercantil e Jornal do Brasil - este dando à matéria o título "O consultor ousado"). Todas as redes de rádio e TV também deram cobertura ao acontecimento. Foram dadas duas entrevistas para a Rádio CBN, uma delas no âmbito nacional. Na Rede Globo, além do noticiário regular, participei de uma entrevista ao vivo no jornal matinal.
Entidades de classe, como o Conselho Regional de Contabilidade, o Sindicato dos Servidores do Tribunal de Contas e a Ordem dos Advogados do Brasil, também manifestaram publicamente o apoio à candidatura técnica.
Na sabatina pública a que todos os candidatos são submetidos, transmitida em direto pela TV Assembléia, ocorreu uma peculiaridade: enquanto a sabatina dos candidatos-deputados durou, em média, 25 minutos, a minha demorou 1 hora e meia. E, enquanto para os demais candidatos as questões colocadas eram apenas de opinião, para mim indagações técnicas foram levantadas, com uma enorme quantidade de perguntas. Felizmente, me saí bem de todas as perguntas e provocações.
Com toda a repercussão na mídia, muitos deputados se arrependeram de assinar o documento que permitiu minha participação, afinal, a imprensa e a opinião pública apoiavam majoritariamente minha candidatura. Devido à minha postura incisiva contra a indicação de políticos para fiscalizar políticos, fui ofendido por alguns parlamentares, sendo que um deles criticou duramente minha candidatura. De forma velada, ainda sofri pressão de alguns membros da direção da Assembléia Legislativa, sugerindo que eu não me envolvesse com assuntos que dizem respeito aos Deputados, e também uma sutil ameaça de morte por parte de um interessado da indicação de um deputado. No entanto, de um modo geral, a maioria dos parlamentares aceitou de bom grado minha participação. Para alguns, inclusive, minha participação dava mais lisura ao processo, mesmo eu não sendo eleito.
No dia da votação, 76 dos 77 parlamentares da Assembléia estavam presentes em Plenário. Apesar do apoio que vinha das galerias, na votação secreta apenas 6 deputados votaram na candidatura técnica. O escolhido foi o ex-deputado Elmo Brás. Na época, a esquerda, representada pelo Partido dos Trabalhadores, tinha 4 deputados, e todos eles me defenderam e votaram em mim.



A SEGUNDA TENTATIVA

Em 2003, com a abertura de uma nova vaga para o Tribunal a ser indicada pelo Parlamento Mineiro, decidi candidatar-me outra vez. A "esquerda", que naquela ocasião era maioria na Casa (dividendos da eleição do Presidente Lula), resolveu apoiar um Deputado conservador, e a grande maioria sequer assinou o documento permitindo minha candidatura. Efetivamente, houve uma grande resistência por parte de todos os Deputados em permitir uma candidatura técnica. Escaldados pela repercussão da primeira candidatura, em 1999, os deputados se recusavam a autorizar minha participação no pleito. No entanto, com muita paciência, e usando uma frase de Voltaire ("Posso não concordar com a sua opinião, mas defenderei até a morte o seu direito de expressá-la"), consegui convencer a quantidade justa de 18 deputados a assinarem o documento.
Mais uma vez, a imprensa, principalmente a local, deu respaldo e destaque à candidatura técnica. O jornal mineiro de maior circulação, Estado de Minas, publicou matéria de uma página comparando o perfil e as propostas da candidatura técnica frente à candidatura política. Dessa segunda vez, participaram da disputa, além de mim, outros dois candidatos parlamentares. Na votação secreta, o ex-deputado Wanderley Ávila foi o vencedor. Eu tive apenas um voto de um deputado desgarrado.



A TERCEIRA TENTATIVA

Em 2005, outra vaga para o Tribunal foi aberta. Mais uma vez apresentei-me como pré-candidato e, para a minha surpresa, não encontrei muita resistência à minha participação. Vários parlamentares comentaram que achavam producente a discussão sobre os critérios de indicação para o Tribunal de Contas e que, mesmo "não podendo" votar em mim, apoiavam democraticamente minha participação.
A imprensa local cobriu a disputa, no entanto não com a mesma ênfase das vezes anteriores. Apesar do destaque sempre presente de uma candidatura independente frente aos interesses políticos, os jornalistas deram mais destaque à disputa que ocorria entre os próprios deputados para definir qual seria o indicado. Na reta final da disputa, permaneceram no pleito dois parlamentares e novamente eu, com minhas propostas provocativas e razoáveis. Na votação em plenário, o vitorioso foi o líder do governo Aécio Neves na Assembléia, Deputado Antônio Carlos Andrada. Eu, repetindo a performance da última tentativa, recebi apenas um voto.



A QUARTA TENTATIVA

Em 2006, com a aposentadoria vitalícia de um Conselheiro, mais uma vaga foi aberta no Tribunal de Contas. Desta feita, obedecendo ao mandamento constitucional, caberia ao Governador do Estado indicar o futuro Conselheiro. Nos bastidores, vários nomes de peso da política mineira eram cotados para o cargo, como o Vice-Governador, o Presidente da Assembléia Legislativa e o Secretário de Estado de Governo. Infelizmente, tais nomes eram apresentados sem se considerar variáveis imprescindíveis, tais como sua trajetória no trato da coisa pública.
A despeito da vaga não pertencer ao Parlamento, decidi colocar meu nome à disposição do Sr. Governador Aécio Neves, caso ele fizesse uma opção técnica e independente para o cargo. Com o respaldo das três candidaturas anteriores e o apoio substancial do Conselho Regional de Contabilidade, convoquei a imprensa e divulguei minhas idéias. Apesar das inúmeras tentativas, e mesmo com a mídia, inclusive nacional (Folha de São Paulo), citando meu nome como uma opção independente, não consegui falar com o Sr. Governador.
Igual tentativa foi feita por meio de entidades de classe, como o Conselho Regional de Contabilidade, que publicou, por três vezes, carta aberta nos principais jornais do Estado (ver arquivo anexo), defendendo uma candidatura técnica e capacitada, em contraposição aos interesses de determinados políticos.
Não obstante toda a movimentação, o Governador Aécio Neves indicou a esposa do Vice-Governador, Sra. Adriene Andrade, para a cobiçada vaga. De acordo com a imprensa local, a indicação pretendeu costurar um acordo político que o Governador tinha com seu vice. Recém formada em Direito, Adriene não comprovou possuir os 10 anos de experiência exigidos na Constituição para ocupar o cargo de Conselheira. Não obstante, seu nome foi referendado pela maioria dos Deputados mineiros. Após a ratificação de seu nome pelo Parlamento mineiro, entramos com uma Ação Popular (ver arquivo anexo), com pedido de liminar, visando a impedir sua nomeação, pelo fato de não possuir os requisitos constitucionais para o cargo, e questionando a moralidade da indicação, uma vez que a Sra. Adriene era esposa do vice-governador A liminar não foi concedida. Paralelamente, o Sindicato dos Servidores do Tribunal de Contas entrou com uma ação alegando que a vaga ocupada pela Sra. Adriene deveria ser preenchida por um membro do Ministério Público junto ao Tribunal, e não por livre escolha do Governador. Esta ação tramita no Supremo Tribunal Federal - STF -, em Brasília.





PROPOSTAS CONSTANTES DE MINHA CAMPANHA PARA CONSELHEIRO:

1) Divulgar, na Internet, todos os gastos do Tribunal. O nível de transparência das contas do Tribunal é mínimo. Aspectos como a execução orçamentária, gastos com pessoal, gastos com viagens, licitações realizadas, contratos celebrados, entre outros, devem ser divulgados.

2) Promover a fiscalização das contas da Assembléia Legislativa pelo Tribunal, e vice-versa. Em muitos Estados brasileiros existe um pacto obscuro entre as Assembléias Legislativas e os Tribunais de Contas, de tal forma que estes não fiscalizam as contas daquelas e vice-versa. Muito cômodo para ambas as partes.

3) Dar ao Tribunal um viés mais punitivo que preventivo. Os corruptos deveriam respeitar e temer os Tribunais de Contas. Atualmente os Tribunais não têm credibilidade e freqüentemente são chamados de tribunais de faz-de-conta. É necessário resgatar a imagem do Tribunal.

4) Ser um defensor de mudanças na legislação em prol do estabelecimento de critérios técnicos e objetivos para a indicação de Conselheiros. Usar o prestígio e o poder do cargo de Conselheiro para discutir e tentar mudar a legislação vigente.

5) Implantar a Auditoria de Gestão. Além das formais auditorias de regularidade e de legalidade, implantar a auditoria operacional, que visa a fiscalizar a efetividade dos gastos públicos, avaliando a realização de políticas públicas.

6) Buscar uma maior integração entre o Tribunal e o Parlamento. Os Tribunais, como órgãos vinculados do Legislativo, devem auxiliar os trabalhos da Assembléia. As Comissões Parlamentares de Inquérito - CPIs -, por exemplo, devem contar com o acompanhamento e a participação de técnicos do Tribunal.

7) Valorizar o servidor do Tribunal de Contas. Diminuir os cargos de recrutamento amplo e valorizar o servidor concursado.

8) Dizer não ao nepotismo. Atualmente, o emprego de parentes é uma prática comum nos Tribunais de Contas.

9) Utilizar somente um mês de férias por ano. Recusar a regalia de três meses de férias a que os Conselheiros atualmente têm direito. Ao mesmo tempo, cumprir o expediente de 40 horas semanais, como os demais trabalhadores, e não apenas comparecer ao Tribunal às terças, quartas e quintas.

10) Tornar público o salário de Conselheiro. Imprimir austeridade, terminando com "penduricalhos" como o auxílio-paletó, o auxílio-moradia e o auxílio-correspondência, que representam salário indireto para os Conselheiros, bem como garantir a obediência ao teto constitucional.

2 comentários:

Anônimo disse...

Prezado Alexandre,
As informações apresentadas por você neste espaço nos ajudam a enxergar como as coisas realmente funcionam nos bastidores da política.
Parabéns pela coragem de se candidatar e pela iniciativa do blog!
Grande abraço,
Nilson

Tiquim de tudo disse...

Parabens Alexandre pela iniciativa ! Quem dera o Brasil fosse mais justo e voce tivesse sido eleito...