Comissão Especial acaba em Pizza


Em 2003, a Assembléia Legislativa do Estado de Minas Gerais instalou uma Comissão Especial para averiguar o funcionamento do Tribunal de Contas. Constituída em razão de denúncias de que o Tribunal de Contas não vinha cumprindo bem o seu papel, a Comissão realizou diversas audiências, recebeu vários convidados e investigou procedimentos afetos à organização interna e à atuação fiscalizadora do Tribunal.

De acordo com a Constituição Mineira, as Comissões Especiais, assim como as Comissões Parlamentares de Inquérito - CPIs -, têm como objetivo proceder a estudos sobre determinada matéria de interesse público, no âmbito da missão fiscalizadora do Poder Legislativo.

O Relatório Final, apresentado pelo Deputado Antônio Carlos Andrada, minucioso e construtivo, apontou diversas irregularidades ocorridas no Tribunal, propondo soluções. Todavia, das 17 propostas apresentadas, apenas duas foram atendidas. Ou seja, a Comissão não foi efetiva em sua missão, pois o Parlamento não levou adiante a cobrança das propostas apresentadas. Lamentavelmente, tudo acabou em pizza. Abaixo, a conclusão final do Relatório.



RELATÓRIO FINAL DA COMISSÃO ESPECIAL
CONCLUSÕES

Esta Comissão Especial, após buscar todas as informações necessárias para averiguar o funcionamento do Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais, sente-se em condições de apresentar algumas conclusões.

1 - É premente a necessidade de realização de concurso para Auditor do Tribunal de Contas. O Auditor do Tribunal é um servidor público e não um agente político, devendo sujeitar-se às regras instituídas no art. 37 da Constituição Federal, que prescreve concurso público para ingresso na carreira. Há mais de 6 anos, o Supremo Tribunal Federal considerou inconstitucional o art. 79 da Constituição Mineira, que delega ao Governador a indicação dos Auditores. O Tribunal de Contas, ao invés de acatar a decisão do Supremo, nunca providenciou a abertura de concurso público para o cargo. Atualmente aquela Casa conta com apenas 2 (dois) Auditores.
Por sua lógica evidente, vale aduzir o argumento do Prof. Menelick de Carvalho, que afirma que os Auditores são uma peça-chave na instrumentalização técnica do Tribunal, desde que concursados. Os Auditores, enquanto técnicos selecionados através de concurso público, apresentam pareceres que representariam o equilíbrio na articulação entre a política e a técnica, entre o papel propriamente constitucional reservado ao Legislativo e o papel instrumental de fornecimento de dados técnicos pelo Tribunal.

2 - Os trabalhos da Comissão colocaram em evidência a dificuldade do Tribunal de Contas em inspecionar, tempestivamente, todos os órgãos e entidades sob sua jurisdição. A grande extensão do Estado de Minas Gerais, com seus 853 municípios, é um obstáculo ao deslocamento de servidores para o trabalho de auditoria externa. Ademais, à luz da nossa Constituição Estadual, as competências do Tribunal vão além do exame formal da legalidade das despesas, pois este deve verificar aspectos como a legitimidade, economicidade e razoabilidade dos atos administrativos. Se acrescentamos as novas exigências de fiscalização derivadas da Lei de Responsabilidade Fiscal, verifica-se que o ordenamento atual tornou mais complexa ainda as atividades do Tribunal.
Assim, dada a dimensão dos encargos do Tribunal e o tamanho do nosso Estado, propomos que a lei de organização do Tribunal promova a regionalização de suas atividades, a exemplo do que ocorre em diversos estados da federação como o Rio Grande do Sul, São Paulo e Rio de Janeiro. A criação de Inspetorias Regionais seria um ganho de qualidade operacional nas atividades do Tribunal.

3 - O Tribunal de Contas é ineficaz em sua atribuição de fiscalização externa. Dos 853 Municípios do Estado de Minas Gerais, menos de 30% sofreram inspeção in loco nos últimos 3 anos. Em relação às entidades da Administração Direta e Indireta do Estado, verificamos que, anualmente, o Tribunal visita apenas cerca de 20% das entidades sob sua jurisdição. Fatores como o reduzido número de funcionários dedicados às atividades fins da entidade e uma inadequada política de prioridades, faz com que a atuação daquela Corte fique prejudicada, o que abre espaço à má gestão pública e sua impunidade. As dificuldades apresentadas pelos Diretores daquela Casa não deveriam justificar a ineficácia no processo de fiscalização externa. Guardadas as devidas proporções, trazemos o exemplo do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul, que com 497 municípios e metade dos servidores do Tribunal de Contas de Minas Gerais, realiza anualmente, pelo menos uma inspeção externa a cada Município e Órgão da Administração Direta e Indireta daquele Estado.
Consideramos a inspeção in loco essencial para avaliar a boa ou má utilização dos recursos públicos. O simples envio eletrônico de formulários para a sede do Tribunal em Belo Horizonte através do sistema informatizado SIACE não é suficiente para verificar se houve fraude, corrupção ou má utilização do dinheiro público. Os Diretores do Tribunal de Contas disseram a esta Comissão, em diversas ocasiões, que uma das principais funções do SIACE é servir de apoio às visitas técnicas realizadas nos órgãos e prefeituras. A partir do momento em que o número de visitas é reduzido, o sistema SIACE perde parte de sua utilidade.
Urge, por conseguinte, o desenvolvimento de um sistema de informatização que exija dos entes fiscalizados maiores dados que permitam os seus cruzamentos como forma de dotar o SIACE de instrumentos para fiscalizar e também atuar no controle da veracidade dos dados e de sua qualidade.

4 - No que se refere à indicação para Conselheiro, a Constituição Estadual acompanha a Carta Federal, sendo impossível sustentar, à luz do ordenamento vigente, alteração no método de indicação política do Conselheiro pela Assembléia Legislativa ou pelo Governador do Estado. Assim, passa pelo Congresso Nacional qualquer alteração em relação ao mandato do Conselheiro.
Trata-se de um tema, entretanto, que merece uma melhor discussão a nível federal, já que a composição exclusivamente política do Tribunal de Contas acaba por comprometer, muitas vezes, seu caráter, que deveria ser notoriamente técnico. De acordo com a carta de princípios da Organização Internacional de Entidades de Fiscalização Superior - INTOSAI, entidade internacional que congrega Tribunais de Contas de diversos países, a principal característica das Entidades de Fiscalização Superior deve ser a independência. Em diversos Tribunais de Contas de países europeus, o prazo de mandato de Conselheiros é limitado – na Itália, por exemplo, são 9 anos -, e existem critérios que evitam que parlamentares com mandato assumam o posto de Conselheiro – na Espanha, por exemplo.
Não obstante, vale observar que a Assembléia Legislativa dispõe de prerrogativa suficiente para evitar que o Tribunal de Contas seja integrado por Conselheiros cuja competência técnica seja relativa. O art. 78 de nossa Constituição reserva ao Legislativo a nomeação de 5 (cinco) Conselheiros, bem como a aprovação dos dois nomes restantes, indicados pelo Governador. Assim, desde que a Assembléia se paute pela isenção e capacidade dos candidatos a Conselheiro, não haverá como possa integrar o Tribunal de Contas indivíduo despreparado para a função de Conselheiro.
Manifestamos proposta de revisão dos métodos de indicação de Conselheiros e de modificação do imperativo de vitaliciedade do cargo de Conselheiro, limitando o prazo com mandato de 8 anos dos mesmos. Também entendemos que para um maior equilíbrio, legitimidade e isenção da Assembléia Legislativa no processo de escolha dos Conselheiros, que parlamentar no exercício de suas funções não possa disputar a vaga para Conselheiro. Sugerimos o envio de uma correspondência aos parlamentares mineiros no Congresso Nacional e aos presidentes da Câmara e do Senado Federal, solicitando que a discussão deste tema faça parte de suas agendas políticas.

5 - Quanto à gestão de pessoal, verificamos que o Tribunal apresenta sérios problemas. Nos parece totalmente incompreensível o Tribunal contratar 418 servidores terceirizados, que representam cerca de 25% dos servidores daquela Casa, e que comprometem 7% do orçamento daquele órgão. Além das tradicionais áreas de limpeza, segurança e serviços gerais - cerca de 150 servidores -, existem outros 250 terceirizados lotados em áreas como Gabinetes de Conselheiros, Departamento de Pessoal, Informática, Diretoria Geral, Biblioteca e Associação de Servidores.
Da mesma forma, nos parece exagerado que 17% dos servidores efetivos do Tribunal – 215 servidores – estejam lotados nos Gabinetes de Conselheiros. Se a estes servidores efetivos somarmos os 51 servidores terceirizados e os 30 servidores de recrutamento amplo que também estão distribuídos em gabinetes, verificamos que cada Conselheiro tem, em média, 42 servidores em seu Gabinete.
Verificamos que somente 46% dos funcionários efetivos estão lotados nas Diretorias Técnicas da Entidade. Os demais estão distribuídos por áreas não diretamente relacionadas com a fiscalização como Diretoria Administrativa, Gabinete de Conselheiros, Secretarias e Câmaras. Se tomamos em conta os servidores terceirizados, que estão relacionados à atividades meio, verificaremos que apenas 1/3 dos trabalhadores do Tribunal estão vinculados à atividade-fim do Órgão.
Outro ponto preocupante é a baixa remuneração dos técnicos do Tribunal. O salário de um técnico em início de carreira é de R$ 1.200,00 para uma jornada de 6 horas de trabalho. Tanto a Diretora Geral, Sra. Raquel Simões, como a Presidente do Sindicato dos Servidores do Tribunal, Sra. Stela Pimenta, manifestaram sua preocupação com este tema, salientando que nos últimos 5 anos o Tribunal perdeu 122 técnicos e inspetores de controle externo, em virtude da baixa remuneração.
Assim, sugerimos que o Tribunal reveja sua estrutura de pessoal, destinando o maior contingente de servidores às atividades fins da entidade. Da mesma forma, achamos necessário diminuir o número de servidores terceirizados e o número de servidores em gabinete de Conselheiro.

6 - A implantação do Ministério Publico Especial junto ao Tribunal torna-se um imperativo com a decisão do Supremo Tribunal Federal, de abril deste ano, que considerou inconstitucional a forma como é organizado atualmente o Ministério Público junto àquela Casa. Neste sentido, apresentamos proposta de Emenda à Constituição tratando da criação do Tribunal de Contas Especial - MPE (anexo 4). Apresentamos ainda, para que possa servir de parâmetro visando uma rápida implantação do MPE em nosso Estado, cópia da Lei nº 11.160, de 1998, que organiza o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (anexo 5), o Regimento Interno do MPE junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (anexo 6) e o edital do último concurso para o cargo de Procurador Adjunto do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul (anexo 7).
O Ministério Público, segundo o ex-Auditor do Tribunal de Contas, Sr. Frederico Pardini, exerce o papel de fiscal do Tribunal de Contas, não podendo ser elemento subserviente do Tribunal e devendo ser tão especializado quanto é, ou deveria ser, o Plenário do Tribunal. Entendemos que esta especialização só ocorrerá com a criação do Ministério Público Especial.

7 - O Tribunal de Contas não sofre nenhuma fiscalização. Seus procedimentos licitatórios, atos de admissão, contratos, execução de despesas, controle dos atos de gestão, entre outros, que devem pautar pelos mesmos princípios de legalidade, legitimidade, economicidade e razoabilidade que o Tribunal exige de seus entes fiscalizados, não são verificados por nenhum órgão público. O envio trimestral do Relatório de Atividades à Assembléia Legislativa não supre a necessidade de fiscalização a que deve se submeter aquele órgão. A falta de controle externo pode conduzir a uma má utilização dos recursos públicos, como já ocorreu no passado.
Propomos que a Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária exerça o papel fiscalizador das atividades do Tribunal de Contas, conforme dispõe o art. 76, § 5º da Constituição Mineira. Com base no Manual de Auditoria elaborado pelo Tribunal de Contas e com o apoio da Consultoria Temática da Casa, deve a Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária visitar periodicamente o Tribunal de Contas, fiscalizando seus procedimentos.
Da mesma forma, entendemos que a Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária deve elaborar um roteiro de como deve ser o Relatório de Atividades enviado trimestralmente a esta Casa, conforme disposto no art. 76, § 4º da Constituição Estadual. Fatores como relação das entidades fiscalizadas no último trimestre, principais irregularidades apontadas, processos enviados ao Ministério Publico, multas aplicadas, entre outros aspectos, dariam uma maior utilidade àquele Relatório. Além disso, informações administrativas sobre a movimentação de pessoal do Tribunal, gastos com serviços de terceiros, gastos com viagens, auxiliariam na avaliação parlamentar da atuação daquela Corte. Atualmente o Relatório de Atividades do Tribunal enviado ao Legislativo, não passa de um montante de dados estatísticos sobre a movimentação de processos naquela Casa, sem aprofundar em aspectos qualitativos da atuação do Tribunal.

8 - A ordem jurídica vigente consagra a vinculação dos Tribunais de Contas ao Poder Legislativo, situando-os como auxiliares deste no exercício do controle externo da Administração Pública (art. 76 da Constituição Estadual). Embora dotados de autonomia técnica e administrativa, e serem responsáveis por diversas competências constitucionais, os Tribunais de Contas deveriam manter um estreito relacionamento com o Legislativo, auxiliando-o no desempenho da fiscalização financeira, patrimonial, contábil, orçamentária e operacional das entidades públicas.
No entanto, verificamos que o relacionamento entre o Legislativo e o Tribunal de Contas quase não existe, sendo que muitos parlamentares pouco conhecem das atribuições e das ações realizadas por aquela Corte. Sugerimos que haja uma maior integração entre estas duas Casas, de forma que o parlamentar possa acompanhar de perto a atuação do Tribunal de Contas e este coopere de forma mais efetiva no auxílio da função fiscalizadora do Legislativo. O acompanhamento dos trabalhos da Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária da Assembléia, por parte de técnicos do Tribunal, seria uma forma que estreitar esta relação. Da mesma forma, entendemos que seria interessante que a Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária divulgue a todos os parlamentares as informações que trimestralmente recebe do Tribunal através do seu Relatório de Atividades (art. 74, & 4º da Constituição Estadual).

9 - Falta transparência na atuação do Tribunal de Contas. Especificamente no que se refere à utilização da Internet, verificamos a existência de diversas informações desatualizadas, dificultando ao cidadão acompanhar, tempestivamente, a atuação e a eficácia daquela Casa. O Relatório de Controle de Contas Anuais, disponibilizado no site, fornece somente os números referente ao ano 2000. O mesmo ocorre com o Relatório de Gestão Fiscal, Relatório Trimestral de Atividades e Relatório de Despesas com pessoal, cujos dados se referem ao ano de 2001. O Tribunal deveria dar o exemplo disponibilizando seus dados tempestivamente em sua página web.
Por outro lado, verificamos que a qualidade das informações prestadas não corresponde àquilo que se espera de um Tribunal de Contas. Após comparar a página do Tribunal de Contas de Minas com as informações prestadas por outros Tribunais de Contas do Brasil, sugerimos uma reformulação no site do Tribunal de Contas, visando incorporar informações como os resultados dos julgamentos das seções, número e natureza das inspeções realizadas, agenda do Tribunal, resultado de denúncias apuradas, formulário permitindo a denúncia eletrônica, execução orçamentária detalhada das despesas do Tribunal, detalhamento dos gastos com serviços de terceiros, relatório estatístico com dados dos Municípios mineiros, quadro de indicadores de economia, eficiência e eficácia na atuação da entidade, auditorias operacionais realizadas, entre outras. Seria aconselhável uma política de acompanhamento sistemático das novidades incorporadas em páginas de outros Tribunais.
Vale ressaltar que consta do organograma do Tribunal uma Diretoria de Informática, cujo um dos objetivos deveria ser cuidar da qualidade da página web do Tribunal.

10 - No que tange ao rito processual de julgamento das contas da Câmaras Municipais e da Assembléia Legislativa, esta Comissão verificou a existência de algumas impropriedades que pretendemos sanar com a apresentação de um Projeto de Lei (anexo 8) visando alterar alguns dispositivos da Lei Complementar nº 33/94, que dispõe sobre a lei orgânica do Tribunal de Contas. No nosso entendimento, a competência do Tribunal de Contas para julgar as contas da Câmara Municipal e do Legislativo Estadual ultrapassam os limites constitucionais. Com nosso proposta, estas Casas Legislativas julgariam, após parecer prévio do Tribunal de Contas, as contas dos ordenadores de despesas por meio do Plenário. Ressaltamos que o projeto de lei apresentado poderá ser aperfeiçoado durante sua tramitação, no objetivo de defender interesse público.

11 - O caráter político da composição do corpo de Conselheiros do Tribunal, facilita a possibilidade de determinada decisão do Plenário do Tribunal, contrariar o parecer técnico do servidor encarregado da análise do processo. Pelo menos em tese, acredita-se que o trabalho técnico foi calcado de todos os cuidados na apuração ou não de uma irregularidade. O Deputado Chico Simões (PT) apresentou a esta Comissão Especial o caso de um processo licitatório em que todos os órgãos do Tribunal, inclusive a Auditoria, levantaram vários vícios no processo de licitação, opinando pela irregularidade da despesa. No entanto, o Plenário do Tribunal entendeu, apesar de todas as evidências, que o fato não era tão grave, decidindo aplicar uma pequena multa pela irregularidade. Buscando evitar contradições desta natureza, sugerimos que o Tribunal de Contas faça constar em seu Regimento Interno dispositivo que exija a fundamentação técnica do voto do Conselheiro, quando este contrariar a opinião da Auditoria.

12 - Na visita desta Comissão ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, verificamos que um dos fatores que garantem a efetividade das decisões do Tribunal de Contas é a existência da Quarta Câmara do Tribunal de Justiça daquele Estado, especializada em julgar os processos provenientes da Casa de Contas. Devido à sua agilidade, segundo o Conselheiro Hélio Mileski, a Quarta Câmara é considerada o "terror dos prefeitos corruptos".
Sugerimos que a Comissão de Administração Pública da Assembléia Legislativa faça um estudo, com o auxílio da Consultoria desta Casa, sobre a possibilidade de modificação da Lei de Organização do Judiciário, criando uma Câmara Especializada em julgamento de crimes contra a Administração Pública e Ações civis de improbidade administrativa de competência originária. Recomendamos que seja estudado o funcionamento da Quarta Câmara do Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, como meio de subsidiar à implantação de projeto similar no Estado de Minas Gerais.

13 - A Constituição Federal de 1988, a Lei Complementar nº 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal) e a Lei Federal nº 4.320/64, são mandamentos de ordem constitucional e infraconstitucional que exigem a implantação do Controle Interno na órbita da Administração Pública. Uma das maiores dificuldades apontadas pelos Diretores do Tribunal presentes a esta Comissão foi a inexistência de sistema de Controle Interno que funcione, nos órgãos e entidades fiscalizados. Visando atender a legislação, atualmente a maioria das entidades declara ao Tribunal que possuem um sistema de Controle Interno. No entanto, a efetividade desde sistema de controle não é verificada rotineiramente pelo Tribunal. Em nossa opinião o Tribunal de Contas deve avaliar a funcionalidade do sistema de Controle Interno das entidades, e não somente a sua existência, declarada pelo próprio ente.

14 - Conforme constatamos em nossos trabalhos, a problemática do papel exercido pelo Tribunal de Contas na fiscalização das contas municipais é muito grande. Fatores como o elevado número de Municípios do Estado dificultam ainda mais uma atuação mais efetiva por parte do Tribunal. Assim, os 90 dias de trabalho desta Comissão não foram suficientes para a análise que merece este tema de profunda relevância. Sugerimos a instalação de uma outra Comissão Especial para estudar, especificamente, a análise de contas municipais e o papel do Tribunal de Contas.
Ao mesmo tempo, sugerimos que a nova Comissão Especial cumpra o papel de acompanhar o desdobramento das conclusões constantes deste Relatório. Salientamos que em 1991 a Assembléia Legislativa constituiu uma Comissão Especial, nos mesmos moldes desta, para analisar o funcionamento do Tribunal de Contas. Na época, aquela Comissão levantou diversos problemas atinentes à Corte de Contas e apresentou sugestões como a realização de concurso para Auditor, a criação de Inspetorias Regionais, uma reorganização administrativa do órgão, uma maior integração com o Legislativo, entre outras. As sugestões citadas, também constam de nosso relatório.

15 - É ainda decisivo, ao nosso ver, que o Tribunal de Contas e a Secretaria de Estado da Fazenda realizem um convênio que possibilite a integração do cadastro de fornecedores, no sentido de coibir fraudes decorrentes da utilização de notas fiscais falsificadas. De acordo com nossa análise, o sistema SIACE não permite a identificação deste tipo de desvio e, nem o cruzamento de fornecedores fantasmas quando uma irregularidade é detectada.
Como mais uma providência, sugerimos que o Tribunal de Contas faça constar de suas deliberações técnicas a obrigatoriedade do ente fiscalizado, quando comprar de fornecedor de fora do Estado de Minas Gerais, apresentar certidão negativa da Receita Estadual do Estado de origem do fornecedor.

16 - O art. 76, XIV, da Constituição Estadual, determina que compete ao Tribunal de Contas examinar a legalidade de ato dos procedimentos licitatórios, de modo especial dos editais, das atas de julgamento e dos contratos celebrados. Neste sentido, o art. 30 do Regimento Interno do Tribunal dispõe que compete à Segunda Câmara do Tribunal, instruir e examinar a legalidade dos procedimentos licitatórios. Em nossa análise verificamos que, em geral, o Tribunal vincula a análise de procedimentos licitatórios e contratos às visitas técnicas que, não constantemente, realiza nos Municípios e órgãos da Administração Direta e Indireta do Estado.
Devido à relevância dos processos de licitação, que por vezes estão repletos de vícios, acreditamos fundamental que o Tribunal estruture de forma particular a fiscalização dos procedimentos de compras e a execução dos contratos deles decorrentes. Sugerimos que o Tribunal edite uma deliberação estipulando a obrigatoriedade dos entes fiscalizados informarem previamente ao Tribunal sempre que realizarem uma licitação cujo valor represente mais de 20% da receita corrente mensal da entidade. Toda a documentação referente ao processo licitatório deverá ser encaminhada ao Tribunal de Contas, que decidirá sobre a necessidade de uma inspeção in loco.
17 - Verificamos que o Tribunal tem uma preocupação muito grande com o aspecto orientador, educativo e pedagógico que mantêm com seus entes fiscalizados. A boa estruturação da Escola de Contas, que freqüentemente oferece cursos a agentes públicos, é um exemplo da ênfase dada pelo Tribunal a esta função orientadora. Não obstante, é importante o Tribunal priorizar em sua cultura organizacional valores relacionados à sua função fiscalizadora, punitiva e coercitiva, cujo objetivo maior é coibir a má utilização dos recursos públicos, penalizando os responsáveis. O Tribunal deve ter um enfoque mais fiscalizador que orientador.

O Auditor Antoninho Trevisan, idealizador de uma Organização Não-Governamental no Município de Ribeirão Bonito, São Paulo, que no começo deste ano apurou diversas irregularidades naquele Município paulista que culminaram na prisão do prefeito da cidade, destaca o papel que deve exercer a sociedade quando o Tribunal de Contas não consegue cumprir sua função. Referindo-se à atuação do Tribunal de Contas de São Paulo, o Auditor comenta que "as quadrilhas têm aperfeiçoado suas formas de atuar, por isso é preciso que os controles por parte da sociedade também se aprimorem. Como foi observado no caso de Ribeirão Bonito, o Tribunal de Contas do Estado de São Paulo tende a verificar somente os aspectos formais das despesas. O órgão fiscalizador não entra no mérito se a nota fiscal contabilizada é fria ou não, se a empresa é fantasma ou não, se o valor é compatível com o serviço ou não, e se o procedimento licitatório foi montado e conduzido adequadamente ou não. O Tribunal só examina tais questões quando estimulado especificamente. Contudo, mesmo que os aspectos formais examinados sejam irrelevantes diante da grosseira falsificação de documentos verificada em muitas Prefeituras, os Tribunais de Contas insistem em manter seus procedimentos. Como na maioria das vezes os aspectos formais são observados cuidadosamente pelos fraudadores, o Tribunal, ao aprovar as contas do Município, acaba por passar atestado de idoneidade a um grande número de corruptos, e exime publicamente de culpa quem desvia dinheiro público".

Nós, parlamentares mineiros, entendemos que o Tribunal de Contas é fundamental para dar transparência à utilização dos recursos públicos. Essa transparência legitima a atuação dos Poderes e os atos praticados por seus agentes. Sem este pressuposto não se vive a democracia. A intenção desta Comissão Especial é contribuir para evitar que nosso Tribunal de Contas chegue à situação de descrédito relatada pelo Sr. Trevisan. Assim, propomos o envio deste relatório ao Tribunal de Contas do Estado e à Comissão de Fiscalização Financeira e Orçamentária desta Casa para que tomem as medida cabíveis.




Nenhum comentário: